A História da Minha Terra

Os Celtas, os Visigodos, os Bárbaros, os Lusitanos, os Romanos, os Árabes, tantos e tantos povos que encheram de história esta pequena grande terra.
Quando a Ribeira de Santarém um dia for 'Amada' então os seus filhos e admiradores descobrirão que a História de Portugal é muito rica.
Esta a terra onde nasci, Princesa abandonada junto do rio que tanto lhe deu e tanto lhe tira.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

O Enterro do Bacalhau e o Exército da Vassoura I

Quem conhece um pouco da história universal, sabe que há lugares que por uma qualquer razão sempre despertaram a cobiça e a inveja de outros povos, sendo que às vezes essa cobiça, inveja ou outro sentimento qualquer negativo , muitas das vezes nasce no próprio seio desses lugares.

Não sei se a Ribeira de Santarém é um desses lugares, mas coisas sem aparentemente qualquer explicação lógica tem acontecido em relação à terra que me viu nascer e para que a memória perdure decidi publicá-lo.
Os que partilharam a infância comigo sabem que nunca tive habilidade para jogar à bola, preferia o Hóquei em Patins e o Atletismo, em especial a Corrida, mas como naqueles tempos a Ribeira não tinha um local para poder praticar tais desportos as consequências se reflectiram no calçado utilizado.
Na maioria das vezes em que os putos se entretinham com a dita 'bola' eu passava o meu tempo nas margens do rio Tejo, nas Valas, nas barreiras, enfim sonhando aventuras que tinha acabado de ler num qualquer livro que levantava na Biblioteca Itinerante da Gulbenkian.


   Aos poucos fui 'escutando' o meio envolvente e mais tarde deliciava-me a escutar os mais 'velhos' da terra. Foram horas e dias em que fui acumulando as histórias que me contavam, muitas das vezes envolvidas em amplos debates entre os 'historiadores' que divergiam entre si neste ou naquele pormenor.

Quero destacar entre esses 'oradores/historiadores' os nomes de João de Barros Ferreira Nunes, o 'João Batatinha'(aquele que mais histórias me contou); o 'Manel Barbeiro'; o Sr. Neves; o Carlos Tondela; o Manuel 'Velhadas'; o Ti Patrício; o sr. João (Guarda Nocturno) e tantos outros, que com nostalgia contaram as suas infâncias e que guardei o melhor que pude.

Jamais esquecerei as incontáveis noites passadas ora no Sporting Clube Ribeirense ora no Teatro Clube Ribeirense, muitas das vezes à volta de uma mesa de 'pano verde' onde quase sempre a Ribeira, as suas gentes e os seus costumes, eram o tema principal.


Nesta foto tirada durante um cortejo das Festas Da Ribeira, no edifício ao fundo mesmo por detrás do 'Zé da Bola', destacam-se dois personagens (um com o dedo na boca, eu, ao lado de camisa branca o Celestino Cunha, o homem do som nas festas) estamos numa das janelas do Sporting Club Ribeirense onde era montado um estúdio de som para apoio dos cortejos e das picarias.

Aqui o Teatro Clube Ribeirense, edifício Centenário, a primeira  Colectividade de todo o Concelho de Santarém. Consultando os seus arquivos verificarão que esta colectividade nasceu sobre uma outra instituição, o Instituto de Socorro a Náufragos (ainda existe desse tempo, um estandarte ou bandeira). Local de encontro entre ribeiristas e Alexandre Herculano. Aqui na Ribeira de Santarém vivia um comerciante, grande amigo de Herculano, amigo esse que sempre que o escritor se deslocava a Lisboa e por lá se demorava uns dias, tomava conta da Quinta de Vale de Lobos, propriedade de Herculano. Este edifício recebia assim por muitas vezes a visita de Alexandre Herculano que escreveu um dia: "Ribeira de Santarém é Movimento, é Vida. Santarém é estagnação, é morte." Ora como podem imaginar, isto não agradou quer ao Clero quer à Nobreza de Santarém.
Tive o privilégio de partilhar amizade com um dos maiores investigadores e divulgadores da obra de Alexandre Herculano, o Professor e Historiador Cândido Beirante. Foram muitas as horas e os dias à conversa com o Professor e falávamos muito sobre a História de Portugal e em especial a história da Ribeira de Santarém e Santarém. Contava-me o Professor das barbaridades cometidas contra o património de Santarém e em especial contra o património da Ribeira. Foram muitas as conversas e as investigações para tentar-mos saber onde ficava a loja desse amigo de Herculano que entre outras coisas vendia alguns produtos que o escritor produzia na sua quinta. Nunca conseguimos desvendar esse mistério.

Contava-me o Professor de um dos muitos ataques perpetrados contra o nosso património. Todos os que conhecem um pouco da Ribeira de Santarém sabem onde fica a 'Casa da Dédé', esta:
                                                                  
                                                                  
Trata-se da Ermida de Nossa Senhora das Neves, erigida sobre uma outra capela a de Santa Iria (a velha). Entre esta Ermida e as primeiras casas à sua direita, agora um espaço vazio, quase em frente à casa do Fernando Sá (Grande Amigo) existia um edifício que, imaginem, foi demolido pelos autarcas de Santarém. Nesse edifício, em tempos pertença de nobres ribeirenses ligados ao Clero, existia uma pequena capelinha onde se destacava um pequeno oratório embutido na parede onde se podia ver uma pequena escultura de Santa Iria, vinda da Ermida da Senhora das Neves ao lado. Esse oratório ou pequeno altar estava por cima de um painel de azulejos seiscentista de um valor incalculável. Do lado direito num acesso a um pátio interior um pequeno poço cujas pedras superiores tinham vindo de uma pequena torre da capela de Santa Iria (a velha) depois Ermida da Senhora das Neves. Essas pedras já de si tinham vindo de uma importante Vila Romana existente entre a Ribeira e Vale de Figueira. No piso desse edifício eram visíveis algumas sepulturas medievais de valor histórico. Quando um dia o Professor Cândido Beirante se deslocou à Ribeira com uma turma sua de estudantes para lhes mostrar toda a história daquela zona e o seu património, reparou que o tal edifício tinha 'desaparecido'. Ao princípio ainda pensou que estava enganado, mas não, conversando com algumas pessoas foi-lhe dito que a Câmara Municipal de Santarém tinha mandado demolir a casa porque ameaçava ruína. Informado depois onde as máquinas tinham despejado o entulho dirigindo-se de imediato para lá com seus alunos foi durante uns dias vasculhando todo o amontoado de História que um Inteligente Camarário tinha com sua 'sensibilidade' para ali despejado. Ainda recuperou alguns azulejos e algumas pedras cheias de História (para os tais senhores da Câmara, calhaus) levou-as para um sótão a 'rebentar' pois também lá tinha partes de umas colunas que recuperou da tal Vila Romana entre a Ribeira e Vale de Figueira. É assim que os autarcas tratam a nossa História de tão cultos que são.
Ermida de Nossa Senhora das Neves - Ribeira de Santarém

Nada me admira nas atitudes da maioria dos Autarcas que por Santarém tem passado, sei que haverá excepções, poucas, mas também temos a nossa 'cota' parte de responsabilidade pois escolhemos partidos e não pessoas, dá, no que tem dado. Mas se dos autarcas não se esperava esta falta de sensibilidade para a nossa história, destes senhores a coisa fica mais impressionante:

-  Instituto de Cestão do Património Arquitectónico e Arqueológico

Ao clicarem neste nome "Igreja de Santa Iria", serão direccionados para uma página deste instituto onde se dá a informação da Igreja Paroquial de Santa Iria. É surrealista, estes senhores 'cuidam' do nosso património. Dão a informação da Igreja, por 'acaso' encerrada, mas as imagens que aparecem são da Ermida de Nossa Senhora das Neves. Claro que se eu os contacta-se para lhes dar conta do erro, surgiria a informação de 'erro informático', recuso-me a perder tempo com estes senhores pagos por todos nós e que trabalham assim.


quarta-feira, 25 de abril de 2012

Quando Até A Alma Doi

 Em Março de 2012, poucos dias antes de partir para o México, decidi mostrar ao meu filho, então com doze anos, a Igreja de Santa Iria. Local da minha infância, igreja onde fui baptizado e ponto de encontro de uma juventude que esperava ansiosamente pelas datas das efemérides, como o Natal, onde em grupos nos deslocávamos às barreiras das Portas do Sol e Buraco de Salinas para recolhermos o musgo , elemento primordial com que 'confeccionávamos' o célebre presépio da Ribeira.
Depois de perguntar como poderia visitar a Igreja (encerrada há treze anos) foi-me informado que a porta estava aberta, facto que estranhei mas não hesitei, avancei com o meu filhote.
Já há muito que eu sabia que a igreja estava encerrada para 'obras' mas o que encontrei foi uma igreja abandonada, completamente esquecida.



Esta a porta por onde entramos, pequeno quintal à direita da igreja junto de um edifício onde em tempos funcionou uma oficina auto. Por aqui já dá para entender o que esperávamos.

Antes de prosseguir um comentário à parte:
- Qualquer culto inclusive o católico necessita de três partes para sobreviver. A saber, os fiéis, os que acreditam e vivem nessa fé e fazem o culto mais ou menos maior de acordo com a sua quantidade  e qualidade. São na sua maioria gente simples e que dão o que muitas vezes não deveriam para manter a sua fé, é a Plebe.
- Depois vem aqueles que tem de  manter as aparências porque a sociedade assim o exige uns com fé, outros nem por isso, vão à missa exibindo o seu melhor fato e as suas melhores jóias e dão pouco, muito pouco, porque os tempos estão difíceis e as jóias estão caras, é a Nobreza.
- Depois vem aqueles que vivem dos dois, são aqueles que bem falantes em geral, vão pregando a palavra do Senhor e convencendo os demais que há um lugar no céu esperando-os, é o Clero.

O que se tem verificado na Ribeira de Santarém nos últimos anos é que sendo uma terra pequena e sem perspectivas de crescimento foi perdendo a sua massa vital, as Gentes. A Plebe sem grandes expectativas, tenta sobreviver o melhor que pode procurando outras margens, a Nobreza sem as condições que o Estado Novo lhes proporcionava viu-se na obrigação de pagar aos 'criados' as férias, os décimos terceiros meses e demais direitos conquistados, logo enfraquecendo o orçamento já de si débil e o Clero como não consegue viver de milagres foi encerrando edifícios de culto um pouco por todos os lados. O Neo-Liberalismo não se apoderou só do País está também nas entranhas da Igreja neste caso da Católica.

Embora eu creia (e trata-se apenas de uma opinião pessoal, nada de juízos de valor) que no caso da Ribeira de Santarém algo mais está para contar. Porque se foi encerrada porque uma parede ameaçava ruína, ao fim de todos estes anos sem o mínimo de manutenção, não só não caiu a tal parede como o que agora parece querer cair é todo o edifício, dizia eu, algo parece escapar ao comum dos mortais.
Senão vejamos, para além de todas as obras de arte que faziam o espólio da igreja e não eram assim tão poucas, de toda a memória daquelas pedras e daqueles azulejos, temos uma escultura que se destaca das demais, a Escultura de Cristo do Mont'Iraz.
Trata-se de uma escultura de valor incalculável, uns dizendo ser do séc. XII outros do séc XIII, outros ainda colocando a sua origem bem mais atrás no tempo. Se bem que nunca seja referido o seu autor, há quem aponte para um traço de origem italiana.
Cristo de Mont'Iráz  Autor desconhecido, escola portuguesa, Século XIV (meados) Escultura em madeira policromada. Ribeira de Santarém, Igreja Paroquial de Santa Iria.

Esta foto e esta legenda vem publicadas na obra Las Edades Del Hombre, 2006 Catedral de Ciudad Rodrigo, pág, 310.
Para os mais atentos, sabe-se que esta não é a escultura que existia na Ribeira mas esta:

  Aqui uma foto de Otília Frade Pires que retirei no Facebook, porque inexplicavelmente as fotos que eu possuía nos meus blogues foram todas apagadas.
Mesmo para os mais leigos nota-se que existe uma profunda diferença. Mas atenção, se a foto a que os espanhóis fazem referência não for uma réplica de imitação pode muito bem tratar-se  de uma escultura do mesmo criador.

Quando me for possível reunir mais material de pesquisa, voltarei ao assunto. Vamos então entrar na Igreja de Santa Iria, eu e o meu 'filhote'.


 Quem a vê por fora não diz o que lá vai dentro.



O altar onde era suposto estar a figura de Cristo de Monte'Iráz
A incúria e a falta de responsabilidade de quem manda nisto

A porta que se vê nesta foto dá acesso à Torre onde para lá dos sinos está ou estaria um relógio que fazia soar os mesmos sinos a todas as horas e meias horas. A meio da Torre, numa porta à direita de quem sobe tínhamos acesso a um patamar (?) que há muito fazia de armazém onde era suposto estar entre outras 'coisas', a figura do Senhor dos Passos (desconheço o autor) e um órgão. À direita da foto a entrada para a Pia Baptismal.


Embora a foto não esteja muito católica é a Pia Baptismal
Outra perspectiva triste da Igreja Paroquial de Santa Iria
Tal como o país, assim está a igreja, escorada.




Alguns dos painéis de azulejos, verdadeiras obras de arte ao abandono.

O meu filho, para que não restem dúvidas da minha intenção primária. Uma sociedade que trata assim o seu património só se define como ela é. Uma sociedade pobre de valores e sem respeito pela sua história.
Eu não esperava encontrar o que encontrei dentro da Igreja de Santa Iria, por isso as fotos foram tiradas com um telemóvel daí a qualidade que deixa muito a desejar. Mas percebe-se a incompetência e o ponto a que chegou o nosso país.